Beco da Lama /Foto: Luiz Nascimento

Por: Leonardo de Oliveira e Luiz Nascimento

Conhecido por suas belas paisagens praianas, Natal é um dos destinos turísticos mais procurados do Nordeste brasileiro. Nos últimos anos, a capital potiguar acompanha uma tendência mundial de transformação dos seus espaços, e estes, consequentemente, ganham mais reconhecimento pelas redes sociais. Esse movimento — conhecido como instagramização — diz respeito à adaptação de lugares para se tornarem visualmente mais atraentes, com o objetivo de estimular o compartilhamento nas mídias, principalmente no Instagram. A partir disso, surgem novas formas de fomentar o turismo e a ocupação na cidade; entretanto, é necessário estar alerta aos efeitos desse fenômeno.

Com a instragramização, em muitos casos, a mudança do espaço é acompanhada por repaginações visuais que reforçam parte da cultura local — com murais coloridos, letreiros, ou painéis artísticos. No Beco da Lama, localizado no Centro Histórico da capital potiguar, os grafites chamam muita atenção dos turistas e dos moradores locais, tornando-se uma das principais atrações. “Acredito que o maior atrativo daqui são todos esses grafites, além dos prédios antigos. Se criou a junção perfeita!”, afirma Daniel Pessoa, assessor de um músico local.

Silvana Gurgel, Professora do curso de Turismo / Foto: Acervo Pessoal

Para explicar o movimento, a geógrafa e professora do curso de Turismo na Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), Silvana Praxedes Paiva Gurgel, observa que o turismo atual se tornou extremamente visual, dependendo grandemente da presença dos meios digitais. “O turismo hoje em dia é uma atividade muito ‘imagética’. As pessoas vão à procura de paisagens bonitas, de cultura, de locais diferentes do seu lugar de origem. Nas redes sociais é possível encontrar essas informações”, afirma.

No bairro de Mãe Luiza, a escadaria que liga a comunidade à orla passou por uma reforma estrutural e artística que mudou completamente a ambientação — assim como o fluxo de visitantes. “Antes, era uma escadaria pequena, com muito mato, ratos e insetos. Depois da reforma, tudo melhorou; muitas pessoas começaram a frequentar o bairro”, comenta Adriano, morador de Mãe Luiza há 40 anos. “Essa mudança [a reforma da escadaria] ajudou principalmente o comércio, porque há muitas pessoas que antes não tinham a mesma renda que têm hoje…”, reforça o morador.

Turistas tirando fotos na Escadaria de Mãe Luiza / Foto: Luiz Nascimento

Situado entre grandes edifícios, frente à orla da praia, é comum os turistas apenas tirarem fotos na base da escadaria, o que demonstra um distanciamento da comunidade local com os novos visitantes. Para a turismóloga, a escadaria é uma obra muito bem feita e pensada para conter um novo processo de erosão, no entanto, acaba maquiando o passado e a atual situação do povo que vive na rua de trás.

Ainda que haja iniciativas do poder público, atrelados com manifestações populares que visem resgatar a identidade local, o turismo cultural, segundo a docente, ocupa uma função secundária no nordeste brasileiro. “Temos um turismo consolidado e voltado para o ‘sol e mar’, deixando a cultura como um adendo. Poucos turistas permanecem em Natal; muitos vão para destinos como Pipa ou Genipabu, sem conhecer espaços como o Museu Câmara Cascudo ou a própria Pinacoteca “, afirma.

Ranúbia Gomes, Funcionária da Pinacoteca Potiguar / Foto: Luiz Nascimento

Apesar disso, as mídias sociais trazem um novo fôlego para áreas com menos atenção das agências de turismo. Para Ranúbia Gomes, funcionária da Pinacoteca Potiguar, as exposições já são pensadas com foco na experiência e na imersão visual. “Tudo hoje é feito e pensando sempre nesses espaços específicos para tirar uma fotografia para você postar”, afirma. “A ideia é que a pessoa fique deslumbrada, registre e divulgue, porque essa divulgação pode chegar à lugares que nós não conseguiríamos”, reforça Ranúbia.

Segundo Silvana, os influenciadores digitais têm um papel importante nesse novo cenário, muitas vezes sendo contratados por estabelecimentos para promover lugares. No entanto, a professora chama a atenção para o risco de o conteúdo divulgado criar falsas expectativas ou distorcer a realidade local: “As redes sociais se tornaram um veículo, e todo veículo é uma faca de dois gumes. Quem divulga precisa ter o cuidado e a sensibilidade de retratar a realidade de forma que não crie expectativas falsas nas pessoas, ao mesmo tempo que resgate a identidade local”.

Assim, o processo de instagramização revela uma grande dualidade: embora haja um esforço para a ampliação da visibilidade e do reconhecimento dos espaços culturais com o fim de atrair novos públicos, há uma simplificação da experiência turística, com a estética sobrepondo-se ao conteúdo histórico e simbólico da cidade. Não somente a simplificação, mas também reduzindo a população local a papéis secundários.

À medida que a cidade se desenvolve, direcionando-se a essa tendência midiática, cresce a responsabilidade de garantir um turismo culturalmente valorizado, e não apenas uma imagem projetada.