Por Victória Z. Alves
A competição mais importante de futebol feminino, a Copa do Mundo, se iniciou há algumas semanas e alguns de nós não percebemos as diferenças de tratamento com o esporte e os atletas das seleções masculina e feminina – como o gênero e o salário, infelizmente – e a comparação demonstra tantas abissalidades a ponto de rememorarmos o tratamento da seleção masculina em um torneio desse nível e todas as diferenças sociais que se perduram com o esporte, categorizando-o e excluindo a apenas um gênero. O que acontece é que o estímulo e o patrocínio para o futebol masculino é muito superior que o feminino, e isso não é surpresa alguma para alguém, ou é?
Há pouco mais de um ano tivemos a copa do mundo masculina – que diferentemente da feminina, teve todo o aparato e comoção da população para acompanhar cada treino, coletiva de imprensa, mal-estar de jogador, curiosidade – elementos que para a copa feminina são, aparentemente, insignificantes. Na mídia esportiva, havia retrospectivas, discussões sobre quem estava mais preparado, quem podia ter os melhores rendimentos e o assunto durante um mês foi exclusivamente a copa do mundo – mas isso não acontece no Brasil quando se trata das mulheres. A mídia não produz o suficiente, canais abertos optam, muitas vezes, por não transmitirem os jogos das meninas, mas por quê? É apenas a baixa em sua procura mesmo ou há preconceito ainda? Falta de investimento? Divulgação?
Muitas perguntas são feitas neste artigo, mas a finalidade não é deixá-las sem respostas, o que ocorre é que devemos acompanhar e apoiar o futebol feminino de forma que todos percebam o equívoco que é fechar os olhos para uma equipe de atletas de nível tão alto, mas, contraditoriamente, com investimentos tão baixos.
O que acontece é que há muito tempo essas atletas foram postas para escanteio (se é que já estiveram em outra parte do campo perante os investidores) e desvalorizadas em suas carreiras – nem sempre consolidadas – e não podemos culpar as jogadoras, o esporte é inconstante. Elas são, muitas vezes, comparadas e inferiorizadas aos homens.
Há quem diga que tal desvalorização da seleção brasileira acontece porque “nunca ganharam uma copa”, mas não deveria ser o contrário? Se nunca foram apoiadas adequadamente e muitas vezes recebem salários baixíssimos em relação aos jogadores do mesmo nível no masculino, as mídias não deveriam abrir mais espaço de visibilidade para essas jogadoras que para iniciar nesse esporte tiveram que lutar e sofrer muito preconceito? Não são singulares as histórias de mulheres que desde meninas sonhavam com a bola e mesmo assim eram privadas dessa prática esportiva, pois o futebol foi socialmente construído como um esporte masculino. Com isso, bonecas foram postas de lado e para virarem bolas a rolarem por pequenos espaços. Nós podemos citar duas com esse mesmo trajeto, há muito para se notar na nossa base, há diversas meninas sonhando o mesmo sonho.
Podemos citar a Sissi, o maior nome feminino antes de Marta no esporte, ela enfrentou muito preconceito e lamentavelmente não conseguiu o reconhecimento que merecia. Ela foi a camisa 10 da seleção e saber chutar a bola, quando criança, foi o seu primeiro ato de resistência. Ela e sua geração iniciaram a trajetória em uma seleção cercada pelo descaso, anos depois do esporte ser finalmente permitido para mulheres no Brasil. Dentre os anos de 1941 e 1979, a prática do futebol feminino era proibida por lei. Esse empecilho pode ser um dos fatores para o futebol ser tão pouco valorizado e ‘vibrado’ como o masculino. A lenda Sisleide do Amor Lima, a Sissi, foi uma das defensoras do manto brasileiro na primeira seleção feminina brasileira, em 1988 ela disputou o Mundial Experimental da modalidade, em que o Brasil ficou com a terceira colocação. Já em 1995, atuou pela Copa do Mundo, já da Fifa, pelo Brasil. Além dos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996, e Sydney, em 2000.
Nosso segundo exemplo é a atual defensora do manto, a Andressa Alves. Ela contou, em uma campanha que protagonizou para a empresa Nike, que ganhava várias bonecas quando criança, mesmo que nunca tenha gostado de brincar com elas. Como não conseguia que a presenteassem com uma bola para que ela pudesse praticar o esporte que amava, usava as cabeças das bonecas para jogar futebol.
No futebol ainda há um tom de machismo por parte do público, só com o aparato midiático e sócio-digital poderemos modificar esse cenário.
Não é de hoje que há desigualdade salarial entre gêneros. Marta, inclusive, é embaixadora da Organização das Nações Unidas (ONU), luta por igualdade e trata esse assunto de forma aberta para expor os problemas que isso reflete na sociedade. A atacante da seleção brasileira lembra sempre a importância da igualdade de direitos para homens e mulheres dentro e fora dos campos. Como embaixadora global da ONU Mulheres, função que ocupa desde julho de 2018, Marta, a única jogadora de futebol eleita por seis vezes a melhor jogadora de futebol do mundo pela FIFA – única com seis títulos mesmo comparado à modalidade masculina – desempenha um outro papel muito importante que é aumentar a conscientização com novos públicos, mantendo o compromisso global. Sendo em maio deste ano uma das nomeadas pelo Secretário-geral da ONU para defender os objetivos globais, a jogadora de futebol torna-se então uma das novas defensoras dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Na copa do mundo de 2019, Marta fez uma espécie de protesto usando uma marca sem patrocínio com as cores azul e rosa, simbolizando a luta pela igualdade salarial no esporte.
Temos que acompanhar, debater e interagir com tudo que nos direciona ao futebol feminino, para que assim possam conseguir mais investimentos e, por consequência, amplie a curiosidade de um público mais vasto, dando possibilidade do esporte nacional feminino ser realmente explorado de forma natural e eficiente. Com isso, vamos acompanhar não apenas a seleção feminina, mas o futebol feminino como um todo, sim ou com certeza? Meninas, podem sonhar, a mudança que está ocorrendo vai te beneficiar!
Muitos tentam diminuir o futebol feminino inferiorizando suas conquistas e de maneira inadequada. O investimento no masculino é bilionário, considerando os salários e a publicidade, por estar por mais tempo inserido no cotidiano cultural da sociedade. Já o feminino tem recebido algum investimento (ainda pouco, é verdade). Seus resultados não podem e nem devem ser comparados aos masculinos. No futebol ainda há um tom de machismo por parte do público, só com o aparato midiático e sócio-digital poderemos modificar esse cenário.
A mobilização pelas redes sociais já é significativa, visto que pela primeira vez o canal aberto de mais audiência do Brasil transmitiu os jogos. Embora tenham sido apenas da nossa seleção, isso já é um avanço significativo, mas não é tudo. Temos que acompanhar, debater e interagir com tudo que nos direciona ao futebol feminino, para que assim possam conseguir mais investimentos e, por consequência, amplie a curiosidade de um público mais vasto, dando possibilidade do esporte nacional feminino ser realmente explorado de forma natural e eficiente. Com isso, vamos acompanhar não apenas a seleção feminina, mas o futebol feminino como um todo, sim ou com certeza? Meninas, podem sonhar, a mudança que está ocorrendo vai te beneficiar!