Gil Araújo/ Agência Fotec
A moda tem a capacidade de contar histórias. Ela pode ser um reflexo de um lugar, um movimento e até de uma vida inteira. Para Giovanne Rodrigues, também conhecido como Cajju, estilista potiguar e criador da “Moda de Cajju”, a moda é tudo isso e mais um pouco: uma jornada de autodescoberta, arte e resistência.
Cajju começou sua caminhada no mundo da costura ainda jovem, entre os 11 e 12 anos, rabiscando vestidos em papéis e sonhando em um dia ser estilista. Na época, ele mal imaginava que esses primeiros traços infantis o levariam a criar uma marca que celebraria a brasilidade, a moda artesanal e as histórias das periferias. “Minha vida foi trabalhando para sobreviver, e isso me fez valorizar o que eu podia criar com o que estava ao meu alcance”, conta.
Das ecobags à Moda de Cajju
A primeira conexão de Cajju com a costura surgiu com sua avó Velma, uma costureira habilidosa que lhe ensinou os fundamentos da costura reta. Em 2022, morando com sua avó, Cajju produziu sua primeira bolsa. Mais tarde, essa peça evoluiria para ecobags pintadas à mão, que rapidamente conquistaram o público natalense pela pegada pop trazida nas pinturas e pela febre desse tipo de bolsa na época.
Sem acesso a cursos formais de costura e moda, Cajju aprendeu tudo na prática, testando técnicas e adaptando-se às ferramentas que tinha em mãos. Ele foi criando diferenciais marcantes para suas peças, como alças estendidas que melhoram a adaptação ao corpo, maxibags com amplo espaço interno e até a garantia de manutenção. “As minhas bolsas não são feitas para durar só alguns meses; são resistentes e têm um valor afetivo.”
Com designs únicos e um forte vínculo com a estética das praias e do mar, Cajju consolidou sua identidade visual. Conchas, tons suaves como off-white e preto, e detalhes minuciosos são marcas registradas das peças que produziu para sua primeira coleção. “O mar me inspira desde sempre, e encontrar uma concha no chão me renova”, explica.
A trajetória de Cajju é marcada pela superação de desafios e pela criatividade em ambientes de recursos limitados. Ele aprendeu a usar materiais acessíveis, como tampas de panela para criar moldes e redes de pesca compradas em bazares para dar vida a peças inovadoras. Essa abordagem sustentável e artesanal define a essência da “Moda de Cajju”, que aposta em peças exclusivas e pintadas à mão.
Comunidade e expansão criativa
O produtor de moda é um membro ativo da comunidade Ballroom potiguar, onde encontrou espaço para experimentar, se inspirar e mostrar seu trabalho. “A Ballroom me mostrou que eu poderia criar peças que eram tanto extravagantes quanto acessíveis. Eu sempre busco referências na alta costura, como Alexander McQueen e Versace, mas adapto tudo para o que tenho à disposição. A partir daí fui desenvolvendo ainda mais minhas habilidades”, explica. Cajju é filho da Casixtranha dentro da comunidade Ballroom e ele reitera o apoio de sua comunidade: “Marxine [sua irmã de Casixtranha] foi parceria importante que ajudou a estruturar a marca e planejar a produção, ela me ensinou coisas que eu precisaria aprender em uma faculdade, e isso foi fundamental para que eu organizasse”, relata.
Além de sua produção dentro da comunidade, Cajju também destaca as colaborações que marcaram sua trajetória. Ele produziu peças para bandas de reggae potiguar. “Eles foram grandes apoiadores do meu trabalho no início, me incentivaram muito e deram visibilidade às minhas criações, como buckets e outras peças exclusivas que conversavam com a identidade da banda”. Cajju ainda afirma que usa e veste seu marido sempre com suas criações em espaços que pudessem lhe gerar visibilidade como festivais e eventos de grande porte, como maneira de divulgação de seu trabalho
Uma moda conectada à família e às ruas
Cajju vê sua marca como um reflexo direto das pessoas e experiências que o moldaram. “A Moda de Cajju precisou de muito tempo pra acontecer, muito investimento mental. Desde pequeno, minha mãe, que era empreendedora, me inspirou. Eu acompanhava ela vendendo lençol e aprendi muito observando como ela lidava com as pessoas”, relembra.
A conexão com sua família também está presente no processo criativo. Cajju sempre costura com uma foto de seu pai por perto, uma pessoa que, segundo ele, sempre o apoiou em sua produção artística. “Meu pai acreditava muito em mim. Ele fazia artesanato com garrafas de vidro e foi dele que herdei a visão de transformar algo simples em arte.”
Nas ruas e nas praias, Cajju encontra inspiração constante, especialmente na moda de pessoas pretas. Ele é atento ao que as pessoas vestem, observando como combinam peças e como imprimem sua identidade em roupas do dia a dia.
Para posterioridade
O primeiro desfile da “Moda de Cajju” aconteceu em 8 de novembro, no evento Graffiti Expo Natal, marcando oficialmente a estreia de suas criações no mercado potiguar. A ambição de Cajju, no entanto, vai além das passarelas locais. Ele sonha em expandir a marca com coleções de roupas de upcycling e uma loja física em Pipa, destino turístico que combina perfeitamente com sua estética praiana. Ele também almeja levar suas criações para grandes eventos de moda, como a Casa de Criadores.
“Quero que as pessoas enxerguem meu trabalho como algo único, mas também plural, que conte histórias e inspire. Cada peça que produzo é uma extensão de quem eu sou e das pessoas que me apoiaram ao longo do caminho”.
Um legado de criatividade
Cajju não apenas cria moda; ele constrói um legado de criatividade e resistência. Suas peças são reflexo de sua história e de sua visão de mundo, celebrando o que há de mais autêntico e especial na moda potiguar. Para ele, cada detalhe importa – desde o corte artesanal até as pinturas feitas à mão, passando pelo impacto que cada peça tem no consumidor.
“Eu quero que quem usa a Moda de Cajju sinta que está vestindo algo especial, algo que carrega uma história. Porque no final das contas, a moda é isso: uma forma de se expressar, de resistir e de sonhar.”
Para conferir o primeiro drop “Desordem Mar” de Moda de Cajju, acesse @modadecajju.