(Foto: Reprodução)

Por Jefferson Bernardino

O Laboratório de Endocrinologia Comportamental, coordenado pela neurocientista Dra. Maria Bernardete Sousa, juntamente com o Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), está promovendo um projeto de pesquisa e assistência clínica para pacientes que, devido à violência urbana, desenvolveram Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Com o título “Análise dos sintomas clínicos e de marcadores biológicos associados à intervenção pela técnica de experiência somática (SE) no tratamento do Transtorno de Estresse Pós-Traumático em vítimas de assaltos na cidade de Natal-RN”, o projeto está em busca de homens na faixa etária dos 18 aos 55 anos que tenham passado por situações de assalto à mão armada.

Os interessados devem procurar a sala do PesqClin, no segundo subsolo do Hospital Onofre Lopes, nos dias 19 e 26 de novembro e 3 de dezembro, das 9h às 12h30 e das 13h30 às 16h30, para passarem por uma entrevista inicial. Após a confirmação do diagnóstico os participantes iniciam o processo psicoterapêutico gratuito por um período de dois meses.

A pesquisa é conduzida pela psicóloga somática e aluna do doutorado em Psicobiologia pela UFRN, Ana Kelly de Almeida. A ideia surgiu em decorrência do aumento de casos de estresse pós-traumático em pacientes que foram alvo desse tipo de violência nos centros urbanos. Em entrevista para a Agência Fotec, Ana Kelly contou um pouco mais sobre o projeto e o TEPT, problema ainda desconhecido pela maioria da população.

O que é o Transtorno de Estresse Pós-Traumático? Quais são os seus principais sintomas?

O TEPT é um problema psiquiátrico que nasceu em ambientes de guerras, mas que não se limita apenas a esse tipo de exposição, e que resulta em sofrimento, prejuízo pessoal e profissional nos indivíduos afetados. O transtorno ocasiona sintomas psicológicos como pensamentos e sentimentos intrusivos, reações fisiológicas como tremores, suor, palpitações e perturbação do sono, e reações comportamentais como, por exemplo, atitudes de evitação. Também apresenta diferentes padrões de combinação que vão desde uma reação de hiperativação do sistema nervoso como experiências de revivência do evento, surtos de raiva e medo extremo. Assim como de hipoativação, que leva o indivíduo a uma reação de embotamento emocional e analgesia. Para ser diagnosticado com TEPT é preciso que o indivíduo tenha vivenciado um evento traumático e que os sintomas persistam por mais de um mês.

Qual é a metodologia da pesquisa e como ela é desenvolvida?

Trata-se de um estudo clínico com população representada por indivíduos do sexo masculino, entre 18 e 55 anos de idade, assaltados a mão armada há no mínimo um mês. Esses serão selecionados a partir de uma entrevista inicial, aplicação de questionários e escalas, consulta psiquiátrica para diagnóstico do TEPT, coleta de sangue para dosagens hormonais de cortisol e psicoterapia semanal por um período de dois meses. Após o término da psicoterapia, os instrumentos são reaplicados, sendo realizado um follow-up (acompanhamento) com os participantes depois do período de 3 meses.

Como o tratamento é feito? Ele é completamente eficaz?

O tratamento é realizado semanalmente através da técnica de Experiência Somática (SE) sem utilização de medicamento. A SE é uma nova forma de terapia desenvolvida por Peter Levine, ao longo dos últimos 45 anos, tendo seu foco dirigido para a resolução de sintomas de estresse crônico e estresse pós-traumático. É uma terapia que difere de terapias cognitivas, pois sua principal estratégia intervencionista envolve o processamento de baixo para cima, direcionando a atenção do paciente para sensações internas, tanto viscerais, como musculoesqueléticas e sensações cinestésicas, ao invés de experiências cognitivas primárias ou emocionais. O objetivo da SE é a finalização de respostas frustradas de luta e fuga que são de base biológica, autoprotetora e defensivas do sistema nervoso. A SE não é uma terapia de exposição, pois evita especificamente a evocação direta e intensa das memórias traumáticas, facilitando a geração de novas experiências corretivas corporais que contradizem aquelas de opressão e desamparo. E sim, a intervenção tem sido muito eficaz, chegando a um resultado entre 80% e 90% na melhora dos sintomas. Os participantes saem mais resilientes do processo, sabendo como lidar com situações estressantes da vida.

Quais são os dados sobre o a ocorrência do estresse pós-traumático no Brasil e no estado?

No Brasil foi encontrado um percentual de 22,6% de TEPT em vítimas de assalto urbano. Pesquisas realizadas no Rio de Janeiro e São Paulo relataram uma prevalência de 86% para eventos traumáticos decorrentes da violência urbana, com um percentual geral de 11,1% para o desenvolvimento de TEPT. A prevalência do TEPT é maior em mulheres, sendo de 2:1 em relação aos homens. Não há dados estatísticos sobre o transtorno no estado.

Quais são as medidas preventivas que o paciente pode adotar para que se mantenha psicologicamente saudável em um contexto de tanta pressão social e de uma criminalidade crescente?

Manter-se psicologicamente saudável é um desafio atualmente que requer uma mudança de hábitos, pensamentos e ações. Eu acredito que práticas de meditação, exercícios de respiração diafragmática, automassagem e interação social são algumas atitudes que podem fazer muita diferença na vida um indivíduo.

O projeto desenvolvido pela psicóloga Ana Kelly Almeida (à direita) e coordenado pela Dra Maria Bernardete (à esquerda), junto ao Instituto do Cérebro, tem como objetivo investigar os sintomas clínicos e marcadores biológicos associados à intervenção. (Foto: Ana Kelly)